Por Ferssant
A indústria musical, essa mesma que um dia revelou talentos como Elis, Raul ou Belchior, agora se contenta em empacotar autotune com carinha de sofrência e vender como espetáculo o que é, na essência, um PowerPoint sonoro. Desde que inventaram o playback, o show não precisa mais de alma. O cantor não canta, a banda não toca, e quando toca, é pra ficar bonito no enquadramento da câmera, tudo ensaiado, milimetricamente editado, sem margem para erro. Sem risco.
Mas arte sem risco é como um beijo sem vontade: só encenação.
A plateia aplaude de pé uma performance vazia enquanto o artista de verdade, aquele que desafina, que sua, que erra e se recompõe, morre à míngua num bar qualquer, com mais verdade num acorde do que toda uma premiação da indústria.
Vivemos numa sociedade atrofiada, infértil, preguiçosa e esteticamente padronizada por um filtro de Instagram. Uma democracia onde 93% é imbecil, logo, somos governados pela imbecilidade coletiva, institucionalizada e glamorizada. A burrice ganhou Wi-Fi.
Estamos diante da maior onda de mediocrização da história humana. A tecnologia que deveria nos aproximar das estrelas nos empurra para dentro de tocas confortáveis onde só ecoam dancinhas virais, frases de efeito e "desafios" de quinze segundos. Não se quer mais desvendar o universo; quer-se um atalho para parecer inteligente com um meme reciclado.
Vivemos sob uma mentira global. Tudo é "reborne": os bebês, os artistas, os políticos. Um teatro de horrores onde a bunda é falsa, o tanquinho é de clínica, o sorriso é alugado e até os traços do rosto foram harmonizados para caber num padrão andrógino que apaga qualquer rastro de identidade. Já nascem crianças que não se parecem com os pais, e nem poderiam, pois os pais não se parecem mais consigo mesmos.
As redes sociais viraram templo e batuta da normalidade. Um deslizar de dedo na tela e somos conduzidos a um banquete de horrores — em 4K, com trilha sonora pasteurizada e legenda para dublar. Tudo superficialmente confortável, como um travesseiro de veludo recheado com asco.
A alma humana, essa sim, vai ficando cada vez mais pixelada.
É triste. É real. É o ser humano atual.
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